domingo, 3 de setembro de 2017

Não me dás um abraço




- Não desapareças, por vezes sou má, sarcástica, ingrata!
Respondeu-me num sussurro noturno.
- Nunca!
Se desapareço, nunca mais te encontrarei.
Falava tão verdade, que o final da frase, saiu-me quase sem ouvido.
Só o mar, era a testemunha da nossa loucura e a duna, a almofada dos nossos ruídos.
- Mas não consigo saber o que fazer contigo!
Sinto, sem nada poder fazer, que estás a perder um punhado de felicidade. E eu, correndo atrás do nada.
Tens medo de ti própria!
- Tento não viver de recordações.
 Trabalho muito e dói. Mas proporciona-me a certeza de viver como desejo, ou como posso!
Ninguém interfere. Mas, quero continuar, tua amiga especial.
- Nós não somos amigos, se o fossemos não fugias de estar com um amigo!
- Sim, amigos que não.... Tu sabes!
Mas tens razão, tenho que assentar e deixar- me levar de uma vez por todas.
De uma vez!
E obrigada por não teres desistido de mim, enquanto estiveste aqui.
Paramos por momentos de falar e contemplamos a noite. Onde o mar tão calmo, era iluminado em pontos distantes, pelos pequenos barcos de pesca dos homens do mar, que viviam mais acima do nosso canto.
- Porra, conquista-me?
Se assim o quiseres!
Libertou ela daquela boca, com sede dos meus beijos, que por momentos me obrigou a deixá-la ali estendida no areal.
- Conquistar-te? Não sei mais o que fazer!
O tempo que possuo perto de ti, é tão mínimo. Que nem consigo conquistar a tua companhia.
- Ok Somos dois!
Voltou ela a utilizar o sarcasmo já habitual. Numa tentativa de pensamentos coincidentes!
- Apenas acho do fundo do coração, que tem que existir algo em nós, para estarmos aqui nesta conversa.
Apenas não acreditamos!
Se te disse-se tudo o que vai na minha cabeça. O escudo caia!
- Eu vou perscrutar as montanhas enormes para descobrir respostas e certezas.
Acabei por acompanhar o seu raciocino, já mastigando em seco com o brilho intenso nos seus olhos.
- Deixa as montanhas e conquista-me sem contagens!
Baseava-se ela, nos nossos encontros, que se podiam contar pelos dedos.
Nisto, aproximou o rosto bem perto do meu, sentia-lhe a respiração ofegante e disparou:
- Embebeda- me! Salvo seja é claro.
Quantas vezes dissemos um ao outro algo de bom???
Nada! Só contagens.
Neste momento acho, que são as contagens que nos salvam!
Não às contagens. Não a atritos verbais.
E sim!
Acho que vou sentir a tua falta e não digas agora merdas. Ouviste!!!
-Estarei sempre por cá!
Ainda tens em mim, um coeficiente de carinho.
Já confessava emocionado!
- E eu aqui!
No fundo sabes disso.
És muito especial. E não digas merdas.
Aproveita que não estou em mim. E que tenho uma lágrima no canto do olho.
E cala-te!
És um bom confidente. Deixa o tempo correr!
Afinal é o tempo que diz tudo!
É o que tenho aprendido.
Quero, desejo, que sejas feliz!
Isso é bom não?
Nesta catrozada de emoções, ainda consegui lançar mais achas para a fogueira!
- A felicidade não se deseja, conquista-se!
- Também, tens toda a razão.
- E se a felicidade também é uma luta? Por vezes sou feliz, já que lutei o bastante, para a merecer por alguns momentos.
Nesta altura, já nos víamos envolvidos, pela areia até aos olhos.
- Eu, perco uma parte dela!
 E cala-te. Não digas merdas.
Merdas”, era o sinal para eu, não a culpar, do porquê de em tanto tempo, em que nos conhecemos. Pouco o tempo, que partilhamos!
-Tenho medo que alguém entre no meu mundo.
Não sei como o partilhar.
Não quero passar pelo que passei.
- Só tu podes encontrar respostas para isso.
- Eu sei!
Às vezes, por momentos, gostava que me abraçasses!
Por momentos raros.
Mas faltou aquele abraço.
E tu sabes disso!
E não digas asneiras! Soltou uma risada bem sonora.
-Faltou o abraço, porque ambos sentimos, que momentos como este, podem não ser repetidos!
Falta-nos conviver mais intimamente, para repartirmos o que sentimos.
E tornar o desejo em paixão.
Tornar o desejo de estarmos juntos, como fazendo parte da nossa vida.
Por esta altura, enlaçávamo-nos com intensa ternura.
Possivelmente, a tentar recuperar os abraços perdidos. Mais parecendo
adolescentes, abraçados como promessa, ao nosso destino.
- O que sou para ti???
- Neste momento, pouco ou nada!
Porque quem foge de mim, quando a procuro…..
- Então porque falamos Nuno?
Não respondi de imediato. Então, respondeu por mim!
- Falamos, porque me procuras e agradeço-te por isso, quando estás por aqui.
E penso, porque ainda sentimos existir, a esperança, de sermos iguais a tantos outros!
Resolvemos abandonar o nosso canto.
Com o luar a iluminar a noite, fazendo sobressair a bela sensação de estarmos por fim, depois de muitas luas, juntos!
Mas a incerteza de sabermos, quando nos encontrar novamente. Criava uma atmosfera insólita e um silêncio incómodo.
- Afinal o que sou para ti?
E não venhas com a inteligência, ou com o humor sarcástico. Fugir à pergunta!
Perante o meu silêncio, a viver a ansiedade, de partir no dia seguinte. Voltou a tocar no assunto!
- Bem, vai pensando na minha pergunta e vai respondendo, se assim o desejares.
- Tenho até ao Natal? Balbuciei por fim!
- Eheh. Para saber a resposta, tenho que me vestir de duende.
Tive e tenho alguns prendados.
Mas não vejo nada neles!
Não sei o que vi em ti, para me expor.
E não sei o que viste em mim!
Bem é o fado.
Vai lá!
Já estava encostado ao portão de casa e quando me preparava para sair, puxou-me pela camisola ensopada em areia, cheirando às algas marinhas.
- Então? ?  
Nada dormi nessa noite!
O voltar a partir, deixou-me tristemente só. E com a certeza de mais uma vez, deixar de partilhar abraços, que já me aqueciam a frieza da distância.


Sem comentários: