quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Os Professores Dos anos Oitenta



Eu confesso que me desleixei na compra do livro de Ciências da Natureza, não interessa o porquê, ainda por cima era quase o único da turma que não o tinha. E quando o fiz já as livrarias assinalavam esgotado e a demora iria ser superior a quinze dias!
Faço aqui a minha auto-avaliação. Mas todo o conceito do professor em relação a mim ultrapassou a barreira das suas competências!
A avaliação que esse mesmo professor fazia de atingia os píncaros da humilhação e era frequente aproveitar-se de eu não possuir o livro (nos primeiros quinze dias de aulas) e perante a turma, murmurar “ Como se pode aprender e ser alguém se nem livro possuiu!”
Ou então- “ Você, assim vai ser um estorvo para a turma”.
Enfim, o professor logo nos primeiros dias, de um ano muito custoso para mim, assumiu a avaliação que iria seguir para comigo, baseada nos efeitos da sua informação!
O livro chegou e o professor sossegou um pouco!
Mas estava escrito que eu iria ser o alvo das suas preferências e era normal, ele depois de avaliar oralmente um aluno bom (era o seu prazer, os alunos bons), seguidamente, avaliar-me, criando assim um efeito de avaliação que lhe permitisse mostrar as suas razões perante a turma, da imagem que tinha criado sobre mim no começo do ano.
Mas havia um senão! Eu, apesar da imagem que ele tinha, era um aluno com potencialidades! E ele sabia-o, porque optava sempre por me confrontar com os melhores, optando por uma ordem de avaliação do seu interesse, e quando assim é, eu acabava por ficar inferiorizado!
Durante os dois períodos, a avaliação do professor sobre mim, baseava-se nos critérios que ele criou logo no começo, o preconceito!
E devido aos longos anos que já levava de ensino (no nosso seio era conhecido pelo cavalo branco devido a ter o cabelo todo branco), assumia a vincada Estereotipia, dado que não tinha em conta a evolução, que eu apesar de tudo sentia que estava a conseguir. E a prova era que nas outras disciplinas o meu grau de aprendizagem era bom (com média de quatro).
Dava-me em todos os testes que eu fazia a nota dois.
Eu estudava, estudava e nada adiantava. E como a disciplina era de perguntas de desenvolvimento, a nota a cada pergunta, era sempre “inc” (abreviação de incompleta). Fazia questão de entregar os testes pessoalmente e quando chegava a minha vez, secamente dizia “Sem evolução”.
Ele sabia que nas reuniões de fim do período, a nota mais baixa que eu obtinha era a dele e claro nem lhe passava pela cabeça, que eu, se fosse avaliado numa outra turma, de certeza que a nota iria ser diferente.
A avaliação que muitos alunos ficam sujeitos ao longo do seu processo de aprendizagem, está dependente em muitos casos, de professores petulantes como este.
Passava as aulas a olhar pelas janelas!
As aulas eram dadas no rés-do-chão do corpo de aulas em forma de quadrado, com as salas viradas para o exterior e ele dava a aula falando e explicando muitas vezes, virado para o exterior focado em qualquer ponto de referência, tão longe de nós, mas tão perto de qualquer movimento feito por nós.
Mas como em tudo na vida, à sempre uma ocasião para o aluno que se sente injustiçado poder fazer valer os seus direitos.
Essa oportunidade terá que ser dada para que o aluno seja “convidado” a fazer uma avaliação ao seu desempenho. No meu caso o professor deu-me essa chance convicto, que nada alterava a informação prévia que possuía de mim. E pensando que eu me acomodava ao silêncio, ou à concordância da sua visão de pensamento critico sobre mim. E de semblante carregado bem no fundo da sala esperou que eu dissesse algo.
Agarrei-a com as duas mãos e joguei-lhe na cara, tudo isto:
“ O problema dos livros, não é minha culpa, é culpa dos meus pais que pouco interesse mostram no acompanhamento dos meus estudos! O objectivo deles é pôr-me a trabalhar o mais cedo possível para ajudar no orçamento do lar!
O professor não tem o direito de me avaliar praticamente antes de o ano começar, por uma situação que me ultrapassa e fazer disso um cavalo de batalha até hoje. E deixar-me numa situação de grande desvantagem perante os meus colegas, criando situações de quase humilhação perante eles, quando sistematicamente me confronta com os mais capazes e não dando oportunidade de fazer o mesmo com os menos capazes.
Sei que nunca me irá dar positiva, porque o seu sistema de correcção é sempre o mesmo e como tal a minha avaliação será sempre igual. Já incutiu em mim o factor de resignação a não passar a esta disciplina e como só falta um período, por sinal o mais curto com pouco peso na nota, já sei o que me espera. Só peço que me deixe em paz até lá.”
O professor, ficou deveras incomodado! Tossiu, uma vez e mais outra, esta já virado para a janela depositando o olhar num ponto tão distante, que demorou uns longos segundos a recomeçar a aula.
Não comentou! E até final não se referiu uma única vez ao assunto. E eu desatei um nó que trazia dentro de mim que me estava a sufocar a cada dia que passava.
A relação professor/aluno a partir dali, não mais foi a mesma. Os critérios adoptados para mim já eram iguais aos restantes colegas. Os poucos dias de aulas que compõem o terceiro período foram passados entre o único teste que eu fiz e aí o professor passou a ter critérios comuns em relação a todos e deu-me positiva (três), o que me deixou feliz da vida, (talvez ele se fosse nesta altura corrigir os outros testes, novamente iria detectar a infidelidade que possuía em relação a mim). Mas infelizmente de pouca duração porque na pauta afixada na janela do polivalente lá estava o número 2 que reflectia os efeitos da informação que o professor sempre julgou possuir sobre mim!

Será que José Sócrates tem razão em questionar que a avaliação dos professores devia ter inicio à trinta anos?

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