domingo, 13 de junho de 2010

A Primeira Etapa





Acabo de chegar da primeira etapa de um percurso terrestre que me levará pelos caminhos de Santiago.
Foram 42 quilómetros, de uma curiosidade inicial que raiava a aventura e agora estendido no sofá com o corpo tão dorido que não à volta que dê, que lance um esgar de dor. Sinto que a aventura está a dar lugar ao peregrino, que é esse o objectivo de tão custosa empreitada.
Começamos com a energia toda de quem nem sonha para onde vai, ainda o dia não tinha nascido.
Os primeiros quilómetros foram galgados como quem vai para uma festança. Conversa daqui, piada dali, lá rumávamos por caminhos ainda a cheirar ao asfalto, já que ainda estávamos em zonas muito habitadas.
A manhã já ia alta e o nosso semblante mostrava os primeiros rasgos de cansaço, ainda nem metade da jornada tinha sido alcançada.
Éramos sessenta pessoas, numa mistura de novatos nestas andanças como eu e outros que já participavam tantas vezes, como eu nunca o irei fazer.
Acompanhava-nos o prior da paróquia cá da terra e líder deste rebanho humano, que era composto por gente desde Paredes, até Esposende. Homem de fé, mas não obcecado por introduzi-la em nós já que sabia que nós iríamos de encontro a ela dado ser esse um dos objectivos destes caminhos revestidos de sacrifício e espiritualidade.
As horas avançam e o cansaço galga o nosso corpo.
O físico desmembra-se do corpo de muitos, mas é agarrado pela força espiritual, que nos auxilia nas horas difíceis e lá seguimos o rumo traçado na crença da fé, que nos vai levar a São Tiago. Ele sim, o santo martirizado, seguindo com amor a doutrina de Cristo.
Os caminhos desbravados por matas hoje não tão densas. São percorridos com a cadência de quatro quilómetros por hora, para que todos chegam com a caminhada feita ao final da primeira etapa.
A dado passo, cruzamo-nos com peregrinos alemães, polacos e solitários portugueses.
Os polacos bastantes jovens, uma dúzia de rostos alegres e olhos claros. Trazem consigo um padre também jovem, que com uma alegria simples e de trato afável, cativa a nossa amizade.
O prior apresta-se para oferecer a nossa ajuda, através do carro de apoio, para aliviar os sofrimentos normais de tão dolorosa, mas enriquecedora caminhada.
Por fim vemos o final á vista!
Ponte de Lima, Vila tão bela e tão cheia de história, acolhe-nos como poiso para o descanso.
Abraçamo-la como uma mãe que nos dá o colo para descansar, mas afinal ainda não era desta vez que esticaríamos as pernas e dávamos descanso ao corpo.
A caminhada ainda não terminara e atravessando a ponte velha com a sua pedra rasgada de tantas memórias, envolvemo-nos por caminhos encharcados devido às chuvas recentes. Obrigando-nos a autenticas acrobacias para evitar encharcar as botas que já não sabiam como confortar os pés já tão inchados como as bolotas.
Por fim avistamos o autocarro e numa correria desenfreada, qual cansaço qual quê! Os mais adiantados aprestaram-se para apanhar os lugares da frente.
Por incrível que pareça a caminhada (à são Tiago que já exiges tanto esforço e ainda só passamos o primeiro troço), ainda não chegara ao fim e num apito estridente vindo do começo da subida, o prior dá o sinal que ainda não seria desta que a caminhada tinha fim.
Mais um quilómetro! Mais um ultimo esforço e finalmente. Será?
O autocarro esperava-nos. Claro no fim da subida e lá partimos exaustos, mas felizes e acredito com fé redobrada para as próximas etapas, ainda mais exigentes, mas encaradas com mais optimismo. Porque ninguém desiste e todos queremos chegar a Compostela e rezar ao santo pelo nosso esforço em prol dele e pela gratidão com que ele deu tudo como mensageiro de Jesus Cristo.

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